A utopia de ser pelo ler: o infinito bate a nossa porta
- Humanismo Caboclo
- 20 de mar. de 2023
- 3 min de leitura
Na tarde de sexta tivemos que fazer um serviço urgente no veículo e não levamos a biblioteca para a praça do Santa Sofia. Fica a sensação de falta. Esta lembra-nos uma indagação recorrente da(o)s visitantes: por que fazemos o projeto? Necessidade existencial... Exercitar diálogos e trocas... Apoiar-nos no longo e fabuloso caminho de “ser mais”... Educar como expressão de nossas utopias... Estimular exercícios de leitura como parte da caminhada de autoconhecimento de cada ser humano...
Temos muitas razões. Ideias elaboradas durante toda uma vida. Ideias que se movimentam a cada final de semana nos exercícios concretos do existir nas praças de Teresina. Um princípio elaborado em nossas andanças é que cada criança leitora é um universo. Precisamos saber lidar com essas individualidades para não engessarmos na expressão fria e engessada de “leitor”. Cada criança aparece como um ser integral nos encontros semanais. Necessitamos explorar possibilidades de trocas entre as completudes do homem educador e das crianças leitoras. Viver “leituras e descobertas do mundo” convida-nos ao infinito humano.

Já que iniciamos essa crônica citando a falta, precisamos esclarecer que a partir desse mês de março não teremos atividades da biblioteca Leituras e Descobertas do Mundo no último final de semana de cada mês. O homem educador e as pessoas colaboradas precisam viajar por outras nuvens do existir. Explicamos para as crianças que precisamos “descansar”. Não é bem isso. Carecemos de tempo para outros campos do viver.

Hoje ganhamos café com leite, bolo de goma e frutas de uma avó que visitou o projeto na Praça dos Orixás. Como é bom a gentileza! Plantar flores de amor nos caminhos de nossas jornadas. Pode ser uma imagem piegas, mas sentimento e comoção jamais deveriam ser ridicularizados. Pelo contrário. Num mundo apegado às coisas e valores econômicos, banhar-se profundamente nas águas do amor em toda a sua infinitude é uma redenção humana.

Essa sensível avó presenteou-nos também com várias crianças leitoras. Quando conheceu nossa biblioteca, retornou a sua casa, trouxe dois netos e convidou meninos e meninas da vizinhança. Como é bom ver tantas crianças com livros nas mãos!!! Seu neto, um leitor compulsivo. Outras crianças, encantadas com as revistas em quadrinho. E os orixás nos abençoando.

Nossas crianças do Parque Wall Ferraz não leram nenhuma história nesta última semana. Alguns já voltaram às aulas (ano passado houve uma longa greve na rede municipal de ensino e o calendário escolar foi alterado). Por que as crianças leem pouco na escola? Uma criança aprende sem competências leitoras? Aprende-se sem gostar de ler? Desenvolve-se a inteligência sem exercícios cotidianos de leitura?
Como não tínhamos experiências recentes de leitura, convidamos três crianças para nos representarem o conto infantil “os três porquinhos”. Como havia duas meninas, “as duas porquinhas e um porquinho”. O lobo mau transformou-se em loba má. Entre as inúmeras recriações da narrativa propomos dar continuidade à história. A loba má teve que voltar para casa e explicar-se aos seus pais por que não trouxera porquinhos para o almoço. Esta ficou de castigo depois de uma bronca severa. Dois amiguinhos lobos visitaram-na e convenceram-na a sair da toca e brincar na mata... Neste ponto, o céu se fechou. Recomendamos que voltassem para casa antes da chuva. Com uma tarefa: pensar o final da história dessa lobinha má.

Duas mães visitaram-nos nessa tarde de domingo com seus filhos. Levaram as crianças para o interior da biblioteca e leram, conversaram... depois correram pela praça, brincaram. Esses são alguns dos encantos de ler numa praça. Alguns bem-te-vis cantavam. Nossas educadoras liam. E nós tomávamos notas para esta crônica. Uma das mães indagou se tínhamos livros para adultos... Provocações para pensarmos inovações para nossa biblioteca.

Depois apareceu uma avó que adora conversar. Pediu um livro de atualidades. Dois irmãos chegaram e pediram gibis e contos de fadas. Uma praça, como espaço aberto e arborizado, convida-nos a experimentar: ler, brincar, caminhar, conversar, meditar... Que venham outras experiências em praças!
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