top of page
Buscar
Foto do escritorHumanismo Caboclo

Movimento em defesa da Educação levou milhares às ruas e mobilizou oposição popular à Bolsonaro

Repórteres do Humanismo Caboclo estiveram na manifestação ocorrida em Teresina neste 15 de maio convocado inicialmente pelas centrais sindicais como Greve Nacional da Educação

Milhares ocupam as ruas de Teresina em protesto contra os cortes na educação e contra a reforma da Previdência (Foto: Maria Clara Morais)

As ruas foram palco para o principal acontecimento político do dia 15 de maio de 2019 em mais de 200 cidades brasileiras. Com cartazes, faixas, bandeiras e um forte sentimento de indignação coletiva, estudantes, professores, pesquisadores e trabalhadores de diversas categorias, mas especialmente da Educação, protestaram em torno de duas pautas principais: contra os cortes de verbas do Ministério da Educação (MEC) para o setor e contra a Reforma da Previdência. O movimento era aguardado desde o anúncio do ministro Abraham Weintraub, em 30 de abril, de que cortaria 30% de recursos. O que afetaria inicialmente a Universidade de Brasília (UnB), a Universidade Federal da Bahia (UFBA) e a Universidade Federal Fluminense (UFF), acabou atingindo todas as instituições federais e prejudicando também unidades nos estados e nos municípios em todos os graus de ensino.

O cenário gerou reações imediatas e, em sua maioria, negativas. Notas de associações de docentes, sindicatos, do movimento estudantil e até os gestores das instituições públicas demonstravam a preocupação com o futuro próximo de inúmeras delas, tendo em vista que a medida já comprometia o pagamento de bolsas, de aquisição material, investimentos e manutenção para funcionamento de pesquisas científicas em diversas áreas do conhecimento e envolvendo as despesas não obrigatórias, a exemplo de serviços como energia elétrica, internet, limpeza, água, segurança, dentre outros. O país que acompanhou uma clara expansão do ensino técnico e superior nos últimos anos, viu a solidez, ainda em construção, ameaçada em um processo de rápida dissolução.

E como não poderia ser diferente em tempos de internet a mobilização que culminou com cerca de 1 milhão de pessoas nas ruas do país, segundo dados da Confederação Nacional de Trabalhadores em Educação, conseguiu transformar declarações dadas, tanto pelo Ministro da Educação, como pelo presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), em memes e hashtags que se concentraram no #tsunamidaeducação.

O movimento teve início em algumas cidades logo nas primeiras horas da manhã e o assunto já era comentado nas redes sociais e imagens viralizaram. Os registros foram tomando corpo conforme os pronunciamentos oficiais. Ao contrário do que se espera, a comunicação do governo parece não ser apaziguadora e demonstra um confronto ideológico muito simplório para a necessidade de resolução dos problemas enfrentados. Enquanto o presidente afirmava que a maioria dos manifestantes eram “militantes” ou “idiotas úteis”, e o ministro tentava culpar os governos do PT pelos problemas atuais, as ruas e as redes respondiam com o aumento da adesão aos atos.


As declarações contrárias às ciências sociais e humanas também foram lembradas. Para o estudante de filosofia, Janiel Sousa, da Universidade Federal do Piauí (UFPI), “o governo falou que filosofia não tem importância. Ela cria um senso crítico nas pessoas para que elas passem a ver a situação como ela é. O que o governo quer é isso: acabar com essa questão do questionamento sobre o que o governo faz. A manifestação é válida, temos que dizer não ao corte.”

Janiel Sousa, estudante de Filosofia da Universidade Federal do Piauí (UFPI) (Foto: Joaquim Cantanhêde)

Os problemas que atingem bolsistas de pós-graduação são constantes e dedicar-se aos estudos de mestrado e doutorado não é tão atrativo frente às dificuldades. Após os cortes, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), fundação vinculada ao MEC e que atua na expansão e consolidação da pós-graduação nos níveis de mestrado e doutorado, afirmou que possuía 92 mil bolsas ativas de pós-graduação nos valores de R$ 1.500 para mestrado e R$ 2.200 para doutorado. O país é um dos que mais se destacam no mundo em número de estudos científicos.

“Faço pesquisa e a minha bolsa está há dois meses atrasada, o CNPQ e a Capes já anunciaram que estão cortando bolsas e a pesquisa está parada, pois não temos dinheiro para ir a campo e é primordial investirmos em educação, pois sem pesquisa e sem ir a campo, não sabemos a realidade social, não construímos políticas públicas e não sabemos como é viver neste país. Por isso vamos lutar para manter a pesquisa, para manter a extensão e para manter a qualidade de ensino da universidade pública brasileira”, declarou Virgílio Filho, estudante de Ciências Sociais da UFPI e membro do Movimento Correnteza.

De acordo com o divulgado pela Agência Lupa, em 25 dos 27 estados do Brasil, as universidades federais disponibilizam mais da metade dos programas de pós-graduação. Além disso, 90% dos melhores programas de pós-graduação estão vinculados à Instituições de Ensino Superior (IES) públicas.

“Estamos lutando por nossos direitos, pelas bolsas, pois estão sendo cortadas e os novos estudantes que vão entrar não vão tê-las. Sabemos que a bolsa é um incentivo para o aluno continuar a ingressar no curso, pois não podemos trabalhar, é dedicação total, então sem bolsa não temos como pagar as contas e nos sustentar. Muitos estudantes são de fora, como eu, por exemplo, que sou de uma cidade do interior do Ceará e se cortarem a minha a bolsa não tem como eu ficar em Teresina e dar prosseguimento a minha pesquisa. Estou pesquisando para produzir conhecimento para a população”, diz Breno Machado de Almeida, mestrando do programa de pós-graduação em genética e melhoramento da UFPI.


As mulheres eram maioria entre os manifestantes vistos nas ruas de Teresina (Foto: Aline Sousa)

Já a professora do Instituto Federal do Maranhão (IFMA) campus de Timon, Laura Emília Meireles, diz que as últimas ações do governo de Jair Bolsonaro significam um desmonte. “É uma punição para quem é pobre nesse país. É um governo da perversidade. Tudo o que beneficia pobre é cortado, destruído. É assim com a Reforma da Previdência, com os cortes anunciados para a educação pública, que reage hoje, pois não aceita a precarização, não aceita os cortes e não aceita que os nossos jovens, das classes populares, sejam condenados à ignorância.”

O tom mais forte foi em defesa de uma educação pública e de qualidade, contando ainda com o entendimento de que todo o sistema merece melhorias no tocante à valorização da classe docente. Assim, centenas de estudantes de faculdades e escolas particulares também participaram da manifestação. Um exemplo foi a professora Francisca Nascimento que leciona na Faculdade Santo Agostinho. “Isso me diz que o Brasil acordou. A situação do nosso país é gravíssima e só o povo mobilizado pode trazer de volta os direitos sociais, especialmente o direito à educação. Quando o jovem se mobiliza o Brasil anda e constrói uma consciência importante que é a do direito para todos”.

Em Teresina, milhares percorreram as principais ruas do centro, partindo de uma concentração geral na sede do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e, por fim, ocuparam a Frei Serafim. As últimas manifestações contra a Reforma da Previdência vêm sendo coordenadas através do Fórum pelos Direitos e Liberdades Democráticas, composto pelas centrais sindicais, sindicatos e entidades do movimento popular e de juventude, criado no dia 22 de fevereiro. A unidade é apontada como um ponto alto para que os atos ocorram com mais força e se consolidem como uma oposição às ações do governo em confronto aos interesses de diversas categorias de trabalhadores.

Em referência a declarações do Presidente da República quanto a indignação de professores e estudantes em relação aos cortes na Educação, manifestantes traziam mensagens de protesto e palavras de ordem (Foto: Aline Sousa)

“Hoje é essa vitória, milhares de pessoas indo às ruas, inclusive das cidades vizinhas, como Timon, mostrando para as três esferas de governo que a classe trabalhadora vai reagir contra esses ataques brutais que pode acabar com a aposentadoria solidária e querem retirar direitos da educação para comprar votos de deputados, através do Bolsolão que é o mensalão do Bolsonaro. Nós temos em algumas escolas o anúncio de fim de alguns projetos, como o Mais Educação, que estão com dificuldades financeiras, projetos que complementam a questão da educação. Temos receio que os cortes no FUNDEB afetem no segundo semestre, inclusive, o pagamento dos salários. Sabemos que há muita corrupção no município de Teresina e no estado também, mas, na verdade, além da corrupção, houveram os cortes e vai ser pior. Não vamos aceitar”, comentou Sinésio Soares, professor da rede municipal e estadual de ensino e presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Teresina (SINDSERM), entidade que compõe o Fórum.

A Universidade Estadual do Piauí (Uespi) também teve representação no ato em Teresina. Estudantes e professores começaram as atividades com a produção de cartazes na Praça Rio Branco. O estudante de direito Kleidson da Silva, sentando no chão da praça, refletia sobre o que colocar no cartaz que levará ao longo da caminhada e depois de pensar um pouco escreveu: “Educação não é balbúrdia!”. O texto fez referência a uma declaração dada pelo Ministro da Educação, em uma entrevista ao jornal Estado de São Paulo, de que as universidades brasileiras estavam “fazendo balbúrdia” ao invés de melhorarem os índices de desempenho.

Os professores da Associação dos Docentes da Uespi (ADCESP), decidiram em assembleia realizada na terça-feira (14/05) aderir ao movimento. A coordenadora geral da Associação, professora Rosângela Assunção, falou da importância do apoio dos professores aos estudantes da UFPI, IFPI e demais setores. “A greve geral da educação é contra todos os ataques feitos às universidades públicas no Piauí. A Uespi também sofre por falta de recursos financeiros para gerir as atividades básicas. Então motivos para lutar é o que mais temos”.

Professores e estudante da Uespi saíram recentemente de uma greve que durou cerca de 28 dias. As várias manifestações realizadas durante a greve buscaram avançar nas negociações junto ao governo do estado do Piauí para nomeação de docentes aprovados no último concurso, autonomia financeira da instituição, plano de carreira da categoria, pagamento de bolsas para estudantes e melhorias na estrutura dos campi.

O dia repercutiu em toda a imprensa e colocou o governo de frente à balança. De um lado estão as decisões políticas e administrativas tomadas até então e que não estão sendo aceitas pelo meio educacional com o apoio da opinião pública, afinal, educação envolve profissionais, famílias, o mercado de trabalho, o desenvolvimento do país. O governo parece seguir sem ouvir a voz das ruas e seleciona que parte das redes sociais quer agradar. Por outro lado, a disposição demonstrada pelos manifestantes do dia 15 de maio pode ser maior devido a dois novos dias nacionais convocados. Um deve ser no dia 30 de maio, após um chamado de setores ligados à União Nacional dos Estudantes (UNE) diante da grande participação estudantil desta quarta-feira. O outro se propõe a uma Greve Geral da classe trabalhadora no dia 14 de junho, convocada pelas centrais sindicais.

A previsão do tempo no Brasil aponta para novas inundações nas ruas.

Dados e análise para reportagem: Ohana Luize

Repórteres das entrevistas: Maria Clara Morais e Joaquim Cantanhêde

Cobertura da participação da Uespi: Joelma Abreu

Comments


bottom of page